Em meus 22 anos como professor em Harvard, nunca tive medo de morder a mão que me alimenta. Meu ensaio de 2014, “The Trouble With Harvard” (“O Problema com Harvard”), clamava por uma política de admissão transparente e meritocrática para substituir o atual “misticismo de asa de morcego e olho de tritão”, que “esconde danos desconhecidos.” Meu “plano de cinco pontos para salvar Harvard de si mesma“, de 2023, instava a universidade a se comprometer com a liberdade de expressão, neutralidade institucional, não violência, diversidade de pontos de vista e o enfraquecimento do DEI (Diversidade, Equidade e Inclusão).
No ano passado, no aniversário dos ataques de 7 de outubro de 2023, expliquei “como gostaria que Harvard ensinasse os estudantes a falar sobre Israel”, convocando a universidade a ensinar nossos alunos a lidar com a complexidade moral e histórica. Há dois anos, cofundei o Conselho pela Liberdade Acadêmica em Harvard, que desde então tem desafiado regularmente as políticas universitárias e pressionado por mudanças.
Portanto, não sou apologista do meu empregador quando digo que as invectivas atualmente dirigidas a Harvard se tornaram desequilibradas. Segundo seus críticos, Harvard é uma “vergonha nacional”, uma “madrassa woke”, um “campo de doutrinação maoista”, um “navio de tolos”, um “bastião de ódio e assédio antijudeu desenfreados”, um “poço de extremismo em tumultos” e um “posto avançado islamista” onde a “visão dominante no campus” é “destrua os judeus, e você destruiu a raiz da civilização ocidental.”
E tudo isso antes de chegarmos à opinião do presidente Trump de que Harvard é uma “instituição antissemita, de extrema esquerda”, uma “bagunça liberal” e uma “ameaça à democracia”, que tem “contratado quase todos idiotas woke, radicalmente de esquerda, e ‘cabeças de vento’ que só são capazes de ensinar o FRACASSO a estudantes e aos chamados futuros líderes.”
Isso não é apenas discurso vazio. Além dos cortes severos em financiamentos de pesquisa de forma geral, o governo Trump tem isolado Harvard ao lhe negar totalmente as verbas federais. Insatisfeita com essas punições, a gestão federal moveu-se para impedir que Harvard matricule estudantes estrangeiros e ameaçou multiplicar em até 15 vezes o imposto sobre seu fundo patrimonial, além de retirar seu status de organização sem fins lucrativos isenta de impostos.
Pode-se chamar isso de Síndrome de Perturbação com Harvard. Sendo a universidade mais antiga, rica e famosa do país, Harvard sempre atraiu atenção exagerada. Na imaginação pública, a universidade é tanto o epítome do ensino superior quanto um ímã natural para queixas contra elites.
Psicólogos identificaram um sintoma chamado “divisão”, uma forma de pensamento em preto e branco no qual os pacientes não conseguem conceber uma pessoa em suas vidas de outro modo que não seja como um anjo adorado ou um vilão odioso. Geralmente trata-se isso com terapia comportamental dialética, aconselhando algo como: A maioria das pessoas é uma mistura de qualidades e defeitos. Vê-las como totalmente ruins pode não ajudar a longo prazo. É desconfortável quando os outros nos desapontam. Como você poderia abrir espaço para o desconforto sem deixar que ele defina sua visão inteira deles?
A nação precisa desesperadamente dessa noção de proporcionalidade ao lidar com suas instituições educacionais e culturais. Harvard, como sou um dos primeiros a apontar, tem problemas sérios. A sensação de que algo está errado na universidade é generalizada, e isso levou a uma simpatia, até mesmo Schadenfreude, com o ataque total de Trump. Mas Harvard é um sistema complexo que se desenvolveu ao longo de séculos e constantemente tem de enfrentar desafios concorrentes e inesperados. O tratamento adequado (como com outras instituições imperfeitas) é diagnosticar quais partes precisam de quais remédios, não cortar sua artéria carótida e assistir o sangue escorrer.
Como Harvard se tornou um alvo tão tentador? Parte da ira é inevitável, consequência de sua própria natureza.
Harvard é enorme: tem 25 mil estudantes e 2.400 professores, distribuídos em 13 escolas (incluindo negócios e odontologia). Inevitavelmente, entre essa multidão haverá alguns excêntricos e encrenqueiros, e hoje suas ações podem viralizar. As pessoas são vulneráveis ao viés da disponibilidade, no qual algum episódio anedótico memorável fica gravado em suas mentes e inflaciona a estimativa subjetiva de sua prevalência. Um esquerdista barulhento vira um campo de doutrinação maoista.
Além disso, as universidades são comprometidas com a liberdade de expressão, que inclui discursos de que não gostamos. Uma corporação pode demitir um funcionário muito vocal; uma universidade não pode ou não deveria.
Harvard, também, não é uma ordem monástica, mas parte de uma rede global. A maioria dos nossos estudantes de pós-graduação e professores foi formada em outros lugares e vai às mesmas conferências e lê as mesmas publicações que todos os outros acadêmicos. Apesar da vaidade de Harvard quanto à sua singularidade, quase tudo que acontece aqui pode ser encontrado em outras universidades de pesquisa intensiva.
Enfim, nossos estudantes não são folhas em branco nas quais podemos escrever à vontade. Jovens são moldados pelos pares mais do que a maioria imagina. Os estudantes são moldados pelas culturas dos colegas em seus colégios, em Harvard e (especialmente com as redes sociais) no mundo. Em muitos casos, a política dos estudantes não é mais atribuível à doutrinação por professores do que o cabelo verde e os piercings no septo.
Ainda assim, parte da inimizade contra Harvard é merecida. Meus colegas e eu nos preocupamos há anos com a erosão da liberdade acadêmica aqui, exemplificada por algumas perseguições notórias. Em 2021, a bióloga Carole Hooven foi demonizada e jogada ao ostracismo, efetivamente afastada de Harvard, por explicar em uma entrevista como a biologia define macho e fêmea. Seu cancelamento foi a gota d’água que nos levou a criar o conselho pela liberdade acadêmica, mas não foi nem o primeiro nem o último.
O epidemiologista Tyler VanderWeele foi forçado a se humilhar em sessões de “justiça restaurativa” quando alguém descobriu que ele havia coassinado um parecer amicus curiae no caso de 2015 na Suprema Corte contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Uma aula do bioengenheiro Kit Parker sobre avaliação de programas de prevenção de crimes foi cancelada depois que estudantes a acharam “perturbadora.” O jurista Ronald Sullivan foi destituído do cargo de diretor de uma residência estudantil quando sua defesa jurídica de Harvey Weinstein fez estudantes se sentirem “inseguros.” A Fundação para Direitos Individuais e Expressão (Fire, na sigla em inglês) contabiliza tais incidentes e, nos últimos dois anos, classificou Harvard em último lugar na liberdade de expressão entre cerca de 250 faculdades e universidades pesquisadas.
Esses cancelamentos não são apenas injustiças contra indivíduos. A investigação acadêmica honesta é difícil se pesquisadores precisam constantemente se proteger para não serem expostos a assassinatos de reputação por um comentário profissional, ou se uma opinião conservadora é tratada como crime. No caso Sullivan, a universidade abdicou da responsabilidade de educar cidadãos maduros ao ceder às emoções dos estudantes em vez de ensiná-los sobre a Sexta Emenda e a diferença entre justiça de turba e Estado de Direito.
Mas uma madrassa woke? Isso é divisão em preto e branco, que precisa de terapia comportamental. Enumerar cancelamentos, especialmente em uma instituição grande e visível como Harvard, pode ofuscar o número muito maior de vezes em que opiniões heterodoxas são expressas sem alarde. Por mais preocupado que eu esteja com ataques à liberdade acadêmica em Harvard, o último lugar no ranking não convence.
Vou começar por mim mesmo. Durante minhas décadas na universidade, ensinei muitas ideias controversas, incluindo a realidade das diferenças sexuais, a hereditariedade da inteligência e as raízes evolutivas da violência (convidando meus alunos a discordar, desde que apresentassem razões). Não reivindico coragem: o resultado foi zero protesto, várias homenagens universitárias e boas relações com todos os chefes de departamento, diretores e presidentes.
A maioria dos meus colegas também segue os dados e relata o que suas descobertas indicam ou mostram, por mais politicamente incorretas que sejam. Alguns exemplos: raça tem alguma realidade biológica. O casamento reduz a criminalidade. Policiamento focado também. O racismo está em declínio. A fonética é essencial para o ensino da leitura. Avisos de gatilho podem fazer mais mal que bem. Africanos participaram ativamente do comércio de escravos. A escolaridade tem parte genética. Reprimir drogas tem benefícios, e legalizá-las traz malefícios. Mercados podem tornar as pessoas mais justas e generosas. Apesar das manchetes, a vida diária em Harvard consiste em publicar ideias sem medo ou favorecimento.
Outra área em que as deficiências de Harvard são reais, mas vê-la como totalmente ruim não ajuda a longo prazo, é a diversidade de pontos de vista. Segundo uma pesquisa de 2023 no The Harvard Crimson, 45% dos membros do corpo docente da Faculdade de Artes e Ciências se identificaram como liberais, 32% como muito liberais, 20% como moderados e apenas 3% como conservadores (a pesquisa não incluiu a opção “idiota woke radicalmente de esquerda e cabeça de vento”). A estimativa da Fire para professores conservadores é ligeiramente maior, em 6%.
Uma universidade não precisa ser uma democracia representativa, mas pouca diversidade política pode comprometer sua missão. Em 2015, uma equipe de cientistas sociais mostrou como uma monocultura liberal levou seu campo a erros científicos, como concluir prematuramente que liberais são menos preconceituosos que conservadores porque testaram o preconceito contra afro-americanos e muçulmanos, mas não contra evangélicos.
Uma pesquisa entre meus colegas no conselho de liberdade acadêmica revelou muitos exemplos em que eles sentiram que a estreiteza política distorceu pesquisas em suas áreas. Em políticas climáticas, isso levou a focar a demonização das empresas de combustíveis fósseis em vez de reconhecer o desejo universal por energia abundante; em pediatria, a aceitar a disforia de gênero relatada por todos os adolescentes sem questionar; em saúde pública, a defender intervenções governamentais maximalistas em vez de análises custo-benefício; em história, a enfatizar os danos do colonialismo, mas não do comunismo ou islamismo; em ciências sociais, a atribuir todas as disparidades de grupos ao racismo, mas nunca à cultura; e em estudos sobre mulheres, a permitir o estudo do sexismo e dos estereótipos, mas não da seleção sexual, sexologia ou hormônios (não por acaso, a especialidade de Hooven).
Embora Harvard sem dúvida se beneficiaria de mais diversidade política e intelectual, ainda está longe de ser uma “instituição radical de esquerda”. Se a pesquisa do The Crimson servir de guia, uma maioria considerável dos professores em Harvard se posiciona à direita do “muito liberal”, incluindo dezenas de conservadores proeminentes, como o jurista Adrian Vermeule e o economista Greg Mankiw. Há anos, os cursos de graduação mais populares são a introdução à economia tradicional, ministrada por conservadores e neoliberais, e as introduções resolutamente apolíticas à probabilidade, ciência da computação e ciências biológicas.
Claro que Harvard também oferece cursos como Etnografia Queer e Decolonizando o Olhar, mas tendem a ser cursos de nicho com pouca procura. Um dos meus alunos desenvolveu um “Woke-o-Meter” baseado em inteligência artificial que avalia as descrições dos cursos em busca de temas marxistas, pós-modernistas e de justiça social crítica (identificados por termos como “heteronormatividade”, “interseccionalidade”, “racismo sistêmico”, “capitalismo tardio” e “desconstrução”). Ele estima que esses cursos representam no máximo 3% dos 5.000 cursos do catálogo da Faculdade de Artes e Ciências para 2025-26 e 6% dos cursos de Educação Geral (embora cerca de um terço destes tenham uma inclinação claramente à esquerda). Mais típicos são cursos como Base Celular da Função Neuronal, Alemão Básico (Intensivo) e A Queda do Império Romano.
Se Harvard está ensinando seus alunos a “desprezar o sistema de livre mercado,” não está fazendo um bom trabalho. As concentrações de graduação mais populares são economia e ciência da computação, e metade dos formandos sai direto da cerimônia para empregos em finanças, consultoria e tecnologia.
Como alcançar uma diversidade ótima de pontos de vista numa universidade é um problema difícil e uma obsessão do nosso conselho. Claro que nem todo ponto de vista deve ser representado. O universo de ideias é infinito, e muitas não merecem atenção séria, como astrologia, terraplanismo e negação do Holocausto. A exigência do governo Trump de auditar os programas de diversidade de Harvard e forçar uma “massa crítica” de dissidentes aprovados pelo governo nas áreas consideradas não conformes seria venenosa tanto para a universidade quanto para a democracia. O departamento de biologia poderia ser obrigado a contratar criacionistas, a faculdade de medicina a contratar céticos de vacinas e o departamento de história, negacionistas da eleição de 2020. Harvard não teve escolha a não ser rejeitar o ultimato, tornando-se um improvável herói popular no processo.
Ainda assim, as universidades não podem continuar ignorando o problema. Embora obsessivas com racismo e sexismo implícitos, têm sido insensíveis ao distorcedor cognitivo mais poderoso de todos, o “viés do meu lado,” que torna todos crédulos com as crenças queridas de si mesmos ou de suas coalizões políticas ou culturais. As universidades deveriam estabelecer a expectativa de que os professores deixem suas políticas na porta da sala de aula e afirmem as virtudes racionalistas da humildade epistêmica e da mente aberta ativa. Para esses fins, um pouco de DEI para conservadores não faria mal. Como disse a economista Joan Robinson (1903-1983), “ideologia é como o ar: você nunca sente o cheiro do seu próprio”.
A acusação mais dolorosa contra Harvard é o suposto antissemitismo —não o antigo preconceito da elite WASP de Oliver Barrett III, mas um transbordamento do zelo antissionista. Um recente e aguardado relatório detalhou muitos incidentes preocupantes. Estudantes judeus sentiram-se intimidados por protestos anti-Israel que interromperam aulas, cerimônias e o cotidiano do campus, muitas vezes recebendo respostas confusas da universidade. Membros do corpo docente inseriram de forma gratuita ativismo pró-Palestina em cursos ou programas universitários. Muitos estudantes judeus, especialmente israelenses, relataram ter sido ostracizados ou demonizados por seus pares.
Como em suas outras doenças, o antissemitismo de Harvard deve ser considerado com um mínimo de discernimento. Sim, os problemas são reais. Mas “um bastião de ódio antissemita desenfreado” com o objetivo de “destruir os judeus como primeiro passo para destruir a civilização ocidental”? Oy gevalt [expressão em iídiche que transmite surpresa ou choque e que poderia ser traduzida como “Oh, meu Deus!”]
Em resposta à infame declaração de 34 grupos estudantis após o 7 de Outubro, responsabilizando “inteiramente” Israel pelo massacre, mais de 400 professores de Harvard publicaram uma carta aberta em protesto. Um novo coletivo, Harvard Faculty for Israel, já tem 450 membros. Harvard oferece mais de 60 cursos com temas judaicos, incluindo oito cursos de iídiche. Embora o relatório de 300 páginas sobre antissemitismo revise todo caso encontrado no último século, até o último grafite e postagem em redes sociais, não cita nenhuma expressão de um objetivo de “destruir os judeus,” muito menos sinais de que isso seria a “visão dominante no campus”.
Se for de valia para alguém, eu não experimentei antissemitismo em minhas duas décadas em Harvard, e outros proeminentes professores judeus também não. Meu próprio desconforto é capturado por um ensaio no Crimson do estudante sênior Jacob Miller, que chamou de “absurda e difícil de levar a sério” a estatística de que 1 em cada 4 estudantes judeus se sente “fisicamente inseguro” no campus, enquanto ele usa quipá orgulhosamente e publicamente todos os dias. A obsessão com o antissemitismo em Harvard representa, ironicamente, uma rendição ao credo da justiça social crítica de que o único mal digno de condenação é o preconceito grupo contra grupo.
Em vez de refutar diretamente as falhas da plataforma antissionista, como a aprovação da violência contra civis e seus pontos cegos históricos, os críticos tentaram associá-la ao pecado do antissemitismo. Mas isso pode se transformar em uma disputa semântica inútil sobre o significado da palavra “antissemitismo,” que, segundo nosso conselho, pode levar a restrições da liberdade acadêmica.
O relatório de antissemitismo de Harvard recomendou muitas reformas sensatas e atrasadas, e esse é o ponto: pessoas responsáveis, diante de problemas em uma instituição complexa, tentam identificar as falhas e corrigi-las. Descartar esses esforços como “passar perfume em esgoto” não ajuda.
Um conjunto deles já foi adotado: aplicar regulamentos já existentes que impedem protestos de ultrapassarem a linha entre expressão de opinião e campanhas de perturbação, coerção e intimidação.
Outro ponto óbvio é aplicar padrões de excelência acadêmica de forma mais uniforme. Harvard tem quase 400 iniciativas, centros e programas distintos dos departamentos acadêmicos. Alguns foram dominados por palestrantes ativistas e se tornaram, na prática, Centros de Estudos Anti-Israel. Ao mesmo tempo, Harvard tem poucos professores com expertise desinteressada em Israel, no conflito do Oriente Médio e no antissemitismo. O relatório pede maior supervisão de professores e decanos nesses temas.
Harvard não pode controlar a vida social dos estudantes ou suas postagens em redes sociais (especialmente em plataformas anônimas onde o antissemitismo mais vil foi expresso). Mas pode aplicar seus regulamentos contra discriminação por religião, nacionalidade e crença política, e contra negligências flagrantes, como um assistente de ensino dispensar aulas para que os alunos participem de protestos anti-Israel. Poderia tratar o antissemitismo com a mesma seriedade dada ao racismo e estabelecer a expectativa, desde o primeiro dia no campus, de que os estudantes se tratem com respeito e abertura para o desacordo.
Também é claro o que não funciona: o corte punitivo do governo Trump sobre o financiamento da ciência em Harvard. Ao contrário do que muitos pensam, uma bolsa federal não é esmola à universidade, nem o Executivo pode usá-la para forçar os contemplados a fazerem o que quiser. É um pagamento por um serviço —ou seja, um projeto de pesquisa que o governo decide (após rigorosa avaliação competitiva) que beneficia o país. A bolsa paga pessoas e equipamentos necessários para realizar essa pesquisa, que não seria feita de outra forma.
O estrangulamento desse apoio por Trump prejudicará os judeus mais do que qualquer presidente o fez em minha vida. Muitos cientistas praticantes e aspirantes são judeus, e o embargo de financiamento os coloca sob terror enquanto são demitidos, seus laboratórios fechados ou seus sonhos de carreira científica destruídos. Isso é muito mais danoso do que passar por uma placa “Globalize a Intifada.” Pior ainda é o efeito sobre o número muito maior de não judeus na ciência, que são avisados que seus laboratórios e carreiras estão sendo extintos para favorecer interesses judaicos. Assim como para os pacientes atuais cujos tratamentos experimentais serão interrompidos, e os futuros que podem ficar sem cura. Nada disso é bom para os judeus.
A preocupação com os judeus é obviamente falsa, dada o simpatia de Trump por negadores do Holocausto e fãs de Hitler. A motivação óbvia é enfraquecer instituições da sociedade civil que funcionam como centros de influência fora do Executivo. Como J. D. Vance disse no título de um discurso de 2021: “As universidades são o inimigo.”
Se o governo federal não obrigar Harvard a se reformar, quem o fará? Há preocupações legítimas de que as universidades possuem mecanismos fracos para feedback e autoaperfeiçoamento. Uma empresa no prejuízo pode demitir seu diretor executivo; um time perdedor pode trocar seu treinador. Mas a maioria das áreas acadêmicas não tem métricas objetivas de sucesso e depende da revisão por pares, que pode acabar em professores conferindo prestígio uns aos outros em cliques autoafirmativos.
Pior, muitas universidades puniram professores e estudantes que criticaram suas políticas, uma receita para a disfunção permanente. No ano passado, um diretor de uma das faculdades de Harvard chegou a justificar essa repressão, até que nosso conselho de liberdade acadêmica reagiu com veemência, e seu superior rapidamente o repudiou.
Ainda assim, existem maneiras de permitir que a luz entre. As universidades poderiam dar um mandato mais forte aos “comitês visitantes” externos que, em tese, auditam departamentos e programas, mas que na prática estão sujeitos à captura regulatória. Os líderes universitários recebem constantemente reclamações de ex-alunos, doadores e jornalistas, e deveriam usar essas informações, com critério, como uma checagem de sanidade. Os conselhos administrativos deveriam estar mais sintonizados com os assuntos da universidade e assumir mais responsabilidade pela sua saúde. A Harvard Corporation é tão reclusa que, quando dois de seus membros jantaram com membros do conselho de liberdade acadêmica em 2023, o New York Times considerou isso notícia digna de reportagem.
A provação pública de quase dois anos pela qual Harvard passou gerou, talvez tardiamente, muitas reformas. A universidade adotou uma política de neutralidade institucional, deixando de discursar sobre questões que não afetam seu funcionamento. Estabeleceu limites para protestos disruptivos e criará uma fiscalização centralizada para que os infratores não possam escolher julgamentos ou contar com a anulação pela faculdade. A Faculdade de Artes e Ciências eliminou as “declarações de diversidade” que avaliavam candidatos a vagas pelo quanto estavam dispostos a escrever discursos “woke”, e seu diretor pediu que diretores de programas relatem a diversidade de opiniões em suas unidades.
Os centros dissidentes estão sob investigação, e seus diretores foram substituídos. O relatório da força-tarefa, solenemente aceito pelo reitor da universidade, Alan Garber, mostra que o antissemitismo está sendo levado a sério. Um novo pacto em sala de aula incentiva os estudantes a estarem abertos a ideias que desafiem suas crenças.
O fato desconfortável é que muitas dessas reformas ocorreram após a posse de Trump e coincidem com suas exigências. Mas, se você está na chuva e Trump lhe diz para abrir um guarda-chuva, não deve recusar só para contrariá-lo.
Fazer as coisas pelos motivos certos é, acredito, o caminho para que as universidades se ajustem e reconquistem a confiança pública. Parece banal, mas com frequência as universidades têm sido guiadas pelo desejo de agradar a seus alunos, evitar inimigos e ficar fora dos holofotes. Vimos o resultado disso.
Em vez disso, os líderes universitários deveriam estar preparados para afirmar o objetivo supremo da universidade —descobrir e transmitir conhecimento— e os princípios necessários para persegui-lo.
As universidades têm o mandato e a expertise para buscar conhecimento, não justiça social. A liberdade intelectual não é privilégio dos professores, mas o único meio pelo qual humanos falíveis alcançam conhecimento. Discordâncias devem ser negociadas com análise e argumentação, não com acusações de preconceito e vitimismo. Protestos podem servir para gerar conhecimento comum de uma queixa, mas não para calar pessoas ou coagir a universidade a fazer o que os manifestantes querem. O espaço universitário pertence à comunidade, cujos membros podem discordar legitimamente, e não pode ser usurpado por uma facção. O patrimônio não é uma página de opinião, mas um tesouro que a universidade tem a obrigação de guardar em confiança para as futuras gerações.
Por que isso importa? Apesar de suas falhas, Harvard (junto com outras universidades) tornou o mundo um lugar melhor, de forma significativa. Cinquenta e dois professores ganharam o Nobel, e Harvard detém mais de 5.800 patentes. Seus pesquisadores inventaram o fermento químico, o primeiro transplante de órgão, o computador programável, o desfibrilador, o teste de sífilis e a terapia de reidratação oral (um tratamento barato que salvou dezenas de milhões de vidas). Desenvolveram a teoria da estabilidade nuclear que salvou o mundo do Armageddon. Inventaram o tee [suporte usado para apoiar e elevar a bolinha] do golfe e a máscara de proteção do recebedor (catcher) no beisebol. Harvard gerou “Vila Sésamo”, The National Lampoon, “Os Simpsons”, Microsoft e Facebook.
Pesquisas em andamento incluem satélites para monitoramento de metano, cateteres robóticos, baterias de próxima geração e robótica vestível para vítimas de AVC. Bolsas federais financiam pesquisas sobre metástase, supressão tumoral, radioterapia e quimioterapia em crianças, infecções multirresistentes, prevenção de pandemias, demência, anestesia, redução de toxinas no combate a incêndios e no Exército, efeitos fisiológicos de voos espaciais e cuidados com feridas em batalha. Tecnólogos de Harvard estão avançando em computação quântica, IA, nanomateriais, biomecânica, pontes dobráveis para militares, redes de computadores resistentes a ataques e ambientes inteligentes para idosos. Um laboratório desenvolveu o que pode ser uma cura para o diabetes tipo 1.
As aplicações práticas não são a única razão que torna Harvard preciosa. É uma fantasmagoria de ideias, uma Disneylândia da mente. Conhecer as pesquisas dos meus colegas é fonte de prazer infinito, e quando olho nosso catálogo de cursos, gostaria de ter 18 anos novamente. DNA extraído de fósseis humanos revela a origem das línguas indo-europeias. Contos de fadas dos Irmãos Grimm, com assassinato, infanticídio, canibalismo e incesto, revelam nossa eterna fascinação pelo mórbido. Uma única rede cerebral é responsável por lembrar o passado e sonhar o futuro. Movimentos de resistência não violenta têm mais sucesso que os violentos. As doenças da gravidez resultam de uma luta darwiniana entre mãe e feto. A oração “Quem é como tu?” na liturgia judaica sugere que os antigos israelitas eram ambivalentes quanto ao monoteísmo.
Se você ainda duvida de que as universidades merecem apoio, considere estas perguntas: você acha que o número de crianças que morrem de câncer a cada ano está adequado? Está satisfeito com sua chance atual de desenvolver Alzheimer? Está contente com nosso conhecimento atual sobre quais políticas governamentais funcionam e quais são desperdício? Está feliz com o rumo do clima, dada nossa tecnologia energética atual?
Em seu manifesto para o progresso, “O Início do Infinito”, o físico David Deutsch escreveu: “Tudo o que não é proibido pelas leis da natureza é alcançável, dado o conhecimento certo.” Paralisar as instituições que adquirem e transmitem conhecimento é um erro trágico e um crime contra as gerações futuras.