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Princípios de Musk valem menos em relação com China – 30/08/2024 – Igor Patrick

Nos últimos dias, conforme a novela entre Elon Musk e Alexandre de Moraes se desenrolava no X, uma imagem aparecia constantemente no meu feed.

Quando alguém tentava defender o bilionário sul-africano e classificá-lo de um paladino da liberdade e da democracia, aqueles contrários a ele respondiam com uma foto —um sorridente Musk apertando a mão de Xi Jinping.

Na maioria das vezes, acharia algo assim uma grande baboseira. A China de fato não é uma democracia, mas relações com o Partido Comunista e sua liderança são essenciais para quem tem dinheiro a perder. É uma escolha entre fazer o possível ou não fazer nada dentro de ambiente regulatório e político restritivo. E muita gente escolhe a primeira opção, de olho no grande retorno financeiro em operar na segunda maior economia do mundo.

Mas Musk não é Tim Cook ou Bill Gates. Sua relação com o regime chinês é muito mais próxima do que a grande maioria dos CEOs conhecidos no ramo de tecnologia. Vai além do pragmatismo do capital e passa por uma postura não apenas cega aos valores que ele tanto diz defender, como também quase propagandista.

Xangai abriga uma gigantesca fábrica da Tesla, e a China é o segundo maior mercado da marca. Graças às políticas governamentais de subsídios a carros elétricos, a montadora vendeu aos chineses o equivalente a 33% de todo o seu faturamento anual em 2023. O investimento também agrada o regime chinês, dada a considerável quantidade de empregos gerados pela Tesla por lá (cerca de 20 mil), o que garante a Musk tapete vermelho toda vez que visita o país asiático.

Foi assim em abril, por exemplo. O empresário foi recebido com pompa de chefe de Estado pelo premiê chinês, Li Qiang, que antes do cargo atual trabalhava como secretário-geral do Partido Comunista em Xangai. Após uma audiência com Li, posou sorridente enquanto recebia láureas: foi chamado pelo número 2 da China de um “modelo de sucesso” para a parceria sino-americana.

Musk alegremente retribuiu, usando o léxico comunista ao declarar que estava pronto para “alcançar resultados ganha-ganha” na China e agradecendo a seus “inteligentes e batalhadores funcionários chineses” para as câmeras da TV estatal CCTV.

Em troca, deixou Pequim com a certificação de dados necessária para expandir o sistema de direção autônoma da Tesla por lá. O feito lhe rendeu US$ 36 bilhões com a valorização das ações da montadora logo em seguida.

Este é apenas um exemplo do seu modus operandi com o regime chinês. Em setembro do ano passado, comparou o status de Taiwan com o estado do Havaí e acusou as forças militares dos EUA de impedirem uma reunificação.

Sobre a situação com os uigures em Xinjiang, onde Pequim é acusada por ONGs e pela própria ONU de promover violações aos direitos humanos desta minoria étnica muçulmana, Musk ponderou que “toda situação tem dois lados” suscetíveis de culpa.

Ele também já se deixou gravar dizendo que os chineses são muito mais inteligentes que americanos e fez questão de enviar uma carta parabenizando o Partido Comunista durante seu centenário em 2021 pela “prosperidade econômica” que a legenda levou à China.

Um nome tão midiático como o de Musk serve à propaganda chinesa tanto quanto Pequim serve aos interesses econômicos do bilionário. E quando cifras tão significativas estão em jogo, os tais ideais democráticos do sul-africano —que ironia— parecem valer bem menos.


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Fonte: Folha de São Paulo

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