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HomeMundoParalheiros tenta resgatar cultura de migrantes alemães - 12/07/2024 - Mundo

Paralheiros tenta resgatar cultura de migrantes alemães – 12/07/2024 – Mundo

Dentro da casa amarela em que vive a família Bueno, o estilo germânico está por toda parte: na arquitetura, no relógio cuco na parede e nos chapéus usados para caminhada com gamsbart —uma espécie de penacho usado no passado para limpar a neve acumulada.

Longe de bairros na zona oeste de São Paulo, popular por manter descendentes de alemães e festividades, a família vive em Colônia, bairro do distrito de Parelheiros, localizado no extremo sul da capital paulista.

A partir de 1827, o território recebeu a primeira onda de imigrantes germânicos em São Paulo e chegou a formar a região com maior concentração de alemães. Além da cultura do país europeu, registrou algumas polêmicas históricas, como a existência de ruas sob o nome de Adolf Hitler e outra de nome Hindenburg, presidente alemão que nomeou como chefe de governo o homem que se tornaria um ditador nazista.

Pouco depois da chegada dos imigrantes em São Paulo, o território até então conhecido como Santo Amaro se emancipou da capital e só voltou a ser incorporado à capital paulista em 1935. A família Bueno é um exemplo da história de descendentes alemães na região.

Estima-se que o primeiro grupo a chegar na região tinha 226 imigrantes. Até o fim de 1829, 926 pessoas de origem germânica desembarcaram no porto de Santos e se estabeleceram, em sua maioria, em Santo Amaro, mas uma parcela foi para Rio Negro, Itanhaém e Cubatão.

Na época, o país europeu enfrentava um aumento da pobreza e superpopulação. No Brasil, independente de Portugal havia pouco, estava em vigor a política do governo de dom Pedro 1º que oferecia à população europeia, incluindo os germânicos, terras e vantagens que convinham aos objetivos de quem emigrava em busca de melhoria nas condições de vida.

A chegada ao Brasil, porém, não foi fácil. Após um desembarque tumultuado, as terras prometidas demoraram a ser entregues. Alguns continuaram com os trabalhos de artesãos, outros tentaram a sorte no centro paulistano.

Os descendentes de alemães que ainda vivem em Parelheiros atuam principalmente com agricultura. Além disso, há um trabalho pelo resgate da cultura. Em 2006, Lucas Lima, 35, decidiu criar um instituto para trabalhar em diferentes frentes a aproximação com a Alemanha e a história da região.

“Ninguém sabia muito da sua história, não tinha um evento para comemorar e manter a tradição”, diz ele, que em 2007 criou a primeira Colônia Fest, que reúne anualmente comida tradicional e dança típica alemã. Hoje, ele preside o Instituto Sociocultural Colônia Alemã, que agora quer criar uma sede e também incentivar o aprendizado da língua germânica na região.

Martina Hackelberg, cônsul-geral da Alemanha no Brasil, afirma que, após a chegada em terras brasileiras, imigrantes fundaram as próprias instituições, como escolas, hospitais, sociedades e até cemitérios. Em Parelheiros, por exemplo, foi fundado o Cemitério de Colônia, em 1829, a necrópole mais antiga em funcionamento de São Paulo.

Depois das ondas migratórias do século 19 e meados do século 20, explica Hackelberg, São Paulo também passou a ser morada de empresários alemães a partir dos anos 1950, em meio a industrialização do Brasil. “Não temos apenas interesses econômicos comuns, mas uma simpatia entre a Alemanha e o Brasil que perdura pelos séculos”, diz a cônsul.

Em Parelheiros, a administradora Débora Bueno, 45, conta que conheceu seu marido, o agricultor Luiz Henrique Bueno, 54, em um grupo de dança folclórica alemã no fim dos anos 1990. Casados há 20 anos, eles têm uma filha de 17 e, dentro de casa, tentam manter as tradições e culturas alemãs.

Juntos, eles ensaiam a dança típica alemã todos os sábados e gostam de cozinhar pratos típicos. “A história do resgate cultural pode ser uma história de amor e gera frutos”, diz Débora.

A língua germânica foi se perdendo ao longo dos anos na família, mas a administradora, que estudou o idioma por dois anos, lembra que por vezes ouvia seus sogros misturarem palavras em alemão com português, como “as Mädchen” para se referir a meninas.

Apesar de casos como o dos Bueno, nem todos os descendentes de alemães conhecem a fundo suas histórias. A família de Bruno Helfstein, 38, por exemplo, conhece pouco sobre suas origens, e a relação com o país de origem é distante. Um antigo conhecido alemão costumava corrigir a pronúncia do próprio sobrenome de Bruno —lê-se “rélfxtáin”.

Seu bisavô chegou na região e ganhou terras. Por lá, a família se fixou e cresceu no ramo da agricultura —hoje planta e vende plantas ornamentais, um dos pontos fortes dos descendentes de alemão. Na escola do seu filho, Helfstein conta que há alguns costumes mantidos, como dança folclórica, embora o primogênito ainda não tenha se animado para praticá-la.

Já sua cunhada, Bárbara Mendes, 20, passou a se interessar pela dança típica com o grupo Freiheit, que atua na região, após um convite de um primo. “Enxerguei na dança uma possibilidade de conhecer melhor a Alemanha”, diz ela, lamentando que sua família tenha perdido parte do conhecimento sobre as origens.

“Não sei qual geração da minha família migrou. Eu perguntava para minha avó, mas ela não sabia”, conta. Bárbara afirma que começar a estudar a dança alemã reacendeu o interesse da família pela cultura —ela já conseguiu até levar outros familiares para as aulas. “A gente acolhe quem quiser dançar da comunidade, não precisa ser descendente [de alemães]. Se interessando pela cultura alemã, é bem-vindo.”

Fonte: Folha de São Paulo

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