O México se prepara neste domingo (1º) para eleger milhares de juízes por meio do voto popular, uma mudança que, segundo o governo, visa acabar com a corrupção, mas que críticos temem que comprometa a independência do Judiciário.
A eleição é fruto de uma reforma proposta pelo ex-presidente de esquerda Andrés Manuel López Obrador (2018-2024) e apoiada por sua sucessora, Claudia Sheinbaum, que chegou ao poder em 2024.
Os dois políticos do partido Morena já fizeram diversas críticas ao Judiciário do país, acusando-o de estar a serviço das elites e envolvido em corrupção. A oposição a Sheinbaum pediu que os mexicanos não fossem votar, alertando que essa nova prática pode permitir que políticos e criminosos influenciem os juízes.
O modelo de eleição que o México estreia é comparado ao da Bolívia, ao de alguns estados dos Estados Unidos e ao da Suíça.
No domingo, serão escolhidos 881 cargos federais, incluindo nove ministros da Suprema Corte, e 1.800 cargos para tribunais locais. Os mexicanos também vão apontar juízes que irão compor o Tribunal Eleitoral e o recém-criado Tribunal Disciplinar (que receberá denúncias contra o Poder Judiciário). A lista chega a 3.422 candidatos.
Diferentemente das eleições tradicionais, os partidos políticos não podem participar do pleito ou apoiar os candidatos publicamente; quem tenta uma vaga também deve financiar a própria campanha. Para 2027 está prevista uma segunda eleição para cargos do Judiciário.
Enquanto o partido do governo critica o Judiciário por impunidade e nepotismo, a oposição argumenta que a eleição nesses moldes pode levar à criação de um regime autoritário que controle todas as instâncias de poder.
Entidades ligadas ao direito também criticam o processo. A associação Jufed (de juízes federais), afirma que os eleitores não escolherão pessoas experientes, mas sim candidatos apoiados pelo governo e pelo crime organizado.
A diretora nacional da entidade, Juana Fuentes, disse em nota que transmitiu a observadores internacionais da OEA (Organização dos Estados Americanos) a preocupação de que as eleições podem ser uma manobra para cooptar o Judiciário.
“[Foi empregada] uma estratégia sistematicamente maquinada pelo Morena, com a cumplicidade do governo federal, de manipular e comprar votos”, diz a nota. “Se trata de desmantelar o único poder que hoje atua como contrapeso.”
A ONG Defensorxs fez um levantamento dos candidatos e considerou 21 como sendo de alto risco. Os apontamentos vão desde suspeitas de nepotismo, como uma concorrente com dez familiares no Judiciário, a um candidato que foi preso nos Estados Unidos por porte e venda de drogas.
Uma das candidaturas mais polêmicas é a de Silvia Delgado, ex-advogada de defesa do notório narcotraficante Joaquín “El Chapo” Guzmán e que aspira o cargo de juíza criminal em Chihuahua, um dos estados onde o cartel de Sinaloa ainda é poderoso.
Quando questionada sobre o tema, ela disse à imprensa internacional que apenas estava fazendo o seu trabalho e que proveu a El Chapo “a mesma defesa que proporcionaria a qualquer outro acusado”.
Organizações de direitos humanos também manifestaram preocupação com uma suposta falta de boas metodologias na seleção de juízes. Antes da reforma, juízes e magistrados eram escolhidos por meio de um processo seletivo realizado pelo Conselho Federal da Magistratura, que submetia os candidatos a um exame para medir sua adequação ao cargo.
Também há o temor de que a reforma judicial afete investimentos internacionais, devido à possibilidade de politização da Justiça.
Um juiz eleito pode decidir sobre questões importantes, como a custódia de crianças, a extradição de traficantes de drogas e a proteção dos direitos individuais.
No México, o voto não é obrigatório e a expectativa de institutos de pesquisa é de uma participação de até 20%, enquanto as últimas eleições presidenciais, das quais Sheinbaum saiu vitoriosa, tiveram 61% de comparecimento nas urnas.
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México faz reforma do Judiciário com eleição de juízes
Como funcionarão as eleições do Judiciário? | No domingo (1º), os eleitores do México escolherão membros do Judiciário. Estão em disputa vagas de 881 juízes federais e 1.800 juízes locais em 19 estados. |
A reforma pode melhorar o sistema? | Apoiadores das eleições dizem que o Judiciário é corrupto e favorece os ricos. Críticos admitem que há problemas, mas afirmam que a reforma pode piorar a situação com a vitória de candidatos de grupos políticos ou criminosos |
O que os críticos à reforma apontam? | Associações de juízes manifestaram a preocupação de que a eleição coloque em risco os direitos tanto de minorias quanto de atores econômicos, trazendo insegurança jurídica ao país e prejudicando investimentos |
O que os governistas argumentam? | A reforma foi uma bandeira do ex-presidente Andrés Manuel López Obrador e é apoiada por sua sucessora, Claudia Sheinbaum. Os morenistas afirmam que o voto popular é a melhor maneira de aprimorar o Judiciário |
Quando serão divulgados os resultados? | O México usa cédulas de papel contadas manualmente. Diferentemente do que ocorre nas eleições presidenciais, a divulgação dos resultados definitivos pode levar mais tempo e está prevista para 15 de junho |