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Livro de ucraniana retrata força de mulheres na guerra – 30/06/2025 – Mundo

“Muitas religiões têm uma figura que podemos chamar de anjo registrador: o espírito encarregado de anotar os atos bons e maus dos seres humanos. Esses registros são então usados por uma divindade para fazer justiça.” Assim descreve a escritora canadense Margaret Atwood (de “O Conto da Aia”) o trabalho de Victoria Amelina (1986-2023) de reportar e registrar a invasão da Ucrânia pela Rússia, no prefácio de “Looking at Women Looking at War — A War and Justice Diary”, cujo título pode ser traduzido como “Olhando para Mulheres que Olham para a Guerra: um Diário de Guerra e Justiça”.

Trata-se de um livro póstumo e inacabado da autora, que morreu em um ataque russo a uma pizzaria em Kramatorsk, no leste. Amelina estava acompanhada dos colombianos Héctor Abad Faciolince, escritor, e Sergio Jaramillo, chefe das negociações de paz do Estado colombiano com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). Os dois sobreviveram, mas Amelina morreu, aos 37 anos, deixando um filho pequeno.

Dois anos depois de sua morte, um grupo de editores e escritores deu forma à obra, que já tinha sua estrutura pronta e cerca de 60% dos capítulos escritos. No posfácio, eles explicam por que se dedicaram ao trabalho: “A vida nos ensinou que há apenas uma maneira de lidar com a dor, continuar o trabalho das pessoas que amamos”. Lançado em fevereiro, o livro recebeu, agora em junho, o prêmio Orwell de escrita política.

Os relatos de Amelina mostram como foi sua própria transformação: de escritora de ficção a repórter de guerra e ativista, atuando junto à ONG Truth Hounds. Descreve os meses anteriores à invasão como algo que inevitavelmente aconteceria, e como vinha se preparando para isso. Entre outras coisas, comprou uma arma e guardou em um cofre.

“Looking at Women Looking at War” reúne retratos de mulheres ucranianas que, diante da invasão russa, passaram a ocupar papéis decisivos —não só no campo de batalha, mas em fazer com que o país siga funcionando. São advogadas, ativistas, bibliotecárias e jornalistas que decidiram documentar o horror, proteger comunidades e preservar arquivos.

Entre elas estão figuras como Evhenia Zakrevska, que trocou a toga pelo uniforme militar; Oleksandra Matviichuk, coordenadora do Center for Civil Liberties e vencedora do Nobel da Paz de 2022; e Yuliia Kakulia-Danyliuk, bibliotecária que organizou uma rede de proteção a famílias em zonas ocupadas. Um dos capítulos contém o depoimento de uma técnica de laboratório em Izyum (ao leste), que relatou o assassinato de colegas por um soldado russo de pouco mais de 20 anos.

Nascida em Lviv, neta de um piloto de guerra soviético, ela se encontrava em viagem ao Egito quando a guerra começou. Voltou, então, à Ucrânia e dedicou-se a evacuar sua família do país. Depois, passou a percorrê-lo para colher depoimentos, além de realizar campanhas pela continuidade das atividades culturais e pela adoção e cuidado dos animais de estimação cujos donos haviam fugido do país.

O retrato da guerra de Amelina é fragmentado, e foi mantido praticamente como ela o deixou com o propósito dos editores de expor como sua vida foi interrompida. Ou, como melhor traduziu Atwood em seu prefácio:

“No meio de uma guerra, há pouco passado ou futuro, pouca perspectiva. Amelina também registra o surrealismo: a sensação de que a realidade foi distorcida como num pesadelo, de que isso não pode estar acontecendo.”

Fonte: Folha de São Paulo

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