Xi Jinping não vem à cúpula do Brics. Depois de sucessivos encontros entre o líder chinês e o presidente Lula que aproximaram Brasil e China a níveis nunca antes vistos na relação entre os dois países, esta será a primeira vez que Xi faltará a uma cúpula do bloco desde que subiu ao comando da segunda maior economia global.
Ato contínuo à notícia, muitas razões foram especuladas na imprensa —com motivos que vão desde o oferecimento de um jantar de Estado a Narendra Modi (o que faria de Xi um coadjuvante), passando pela frequência de encontros de alto nível dele com Lula ou mesmo o rumor de que teria trocado o Brics por uma visita à COP em novembro —, mas talvez seja relevante comentar sobre um menos comentado: é possível que Xi esteja aos poucos se aposentando.
Claro, falar sobre sucessão na China em uma era de concentração de poder sem precedentes em torno de Xi talvez soe estranho ou despropositado. Ele é, possivelmente, o líder mais poderoso desde Mao Tse-tung, acumula funções no partido e no Estado, na esfera civil e militar, praticamente fez desaparecer facções internas contrárias ao seu controle e nada sugere que não tentará a reeleição para um quarto mandato em 2028.
Ainda assim, há sinais sutis de que esteja cautelosamente preparando um sucessor. E há chances de que ele seja justamente Li Qiang, que o substituirá na visita ao Brasil na semana que vem.
Ex-secretário-geral de Shanghai e colega de Xi quando ambos serviram em postos de menor prestígio em Zhejiang, Li subiu na hierarquia como nenhum outro premiê desde de Zhou Enlai. A despeito da desastrosa condução da pandemia na maior metrópole do país asiático, foi alçado ao posto de premiê sem nunca ter ocupado um cargo no Politburo e, desde então, vem substituindo Xi com cada vez mais frequência.
Xi, que no início do mandato fazia em média 12 viagens internacionais por ano, recentemente reduziu o número para algo em torno de 8. Ao mesmo tempo, tem sido Li a representá-lo em fóruns como o G20 da Índia em 2023, no Fórum de Boao para a Ásia e na Expo China-Asean naquele mesmo ano e no Fórum de Desenvolvimento da China em 2024.
Desde o início deste ano, foi ele o responsável por liderar a delegação chinesa na Reunião Anual do Conselho de Governadores do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (AIIB), na inédita cúpula trilateral Asean-China-GCC e mais recentemente no Fórum Econômico de Verão em Davos.
Para alguns, essa projeção indica que ele pode estar sendo preparado para, no futuro, assumir a liderança chinesa. É um argumento válido, ainda que careça de cautela. Basta lembrar que em 2017, o então secretário-geral do PC em Chongqing, Chen Min’er, era apontado como herdeiro provável de Xi. Hoje, ele está longe do centro de poder e pouco se fala sobre sua figura em Pequim.
No Partido Comunista, nomear sucessores cedo demais costuma enfraquecer quem governa. Mao e Deng conduziram transições de forma opaca para conter disputas internas. Xi faz o mesmo: dá espaço a figuras como Li, mas mantém sob controle direto o Exército, a segurança e a máquina de propaganda, pilares de sua força.
De agora em diante, cada missão de Li em fóruns internacionais servirá para aumentar especulações em torno de um anúncio da transição. Mas talvez sejam de fato testes de lealdade e sinal de estabilidade. Ao mesmo tempo, um premiê ativo ajudará a projetar continuidade, mesmo com Xi ainda centralizando decisões.
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