Existem muitas narrativas sobre por que os poloneses têm se inclinado para a direita autoritária nos últimos anos. Uma das mais comuns diz o seguinte: somos uma nação religiosa, com valores profundamente conservadores. Parece convincente —até começarmos a examinar mais de perto. A resposta, como era de se esperar, é muito mais complexa. E potencialmente mais reveladora.
Na Polônia, há uma crença persistente de que o presidente do país simplesmente não pode ser muito liberal. Isso pode parecer lógico —até lembrarmos que, em 1995, o país elegeu Aleksander Kwaśniewski, um líder de esquerda que se identificava abertamente como ateu e expressava opiniões bastante progressistas (pelos padrões dos anos 1990, é claro).
Com a recente vitória de Karol Nawrocki, o candidato da direita autoritária, é tentador recorrer novamente à mesma explicação simplista.
Mas as visões políticas dos poloneses estão longe de ser uniformes. De acordo com uma pesquisa de maio, 39% se identificavam como de direita, mas 29% diziam ser de esquerda, e outros 19% se declaravam de centro.
Isso significa que a Polônia não precisa, necessariamente, ser governada pela direita. Na verdade, se dividirmos o campo político em dois grandes blocos —o liberal de esquerda (democrático) e o de direita (autoritário)—, o primeiro pode até ter uma ligeira vantagem. Vimos isso claramente nas eleições parlamentares de 2023, quando os partidos que formariam a coalizão governante juntos conquistaram mais de 53% dos votos.
Então, por que a direita continua vencendo?
Há duas razões principais. Primeiro, desde a transição política de 1989, a esquerda e o centro gradualmente abandonaram uma parcela significativa do eleitorado —aqueles em piores condições econômicas, com menor nível de escolaridade, vivendo em pequenas cidades e áreas rurais. Sua comunicação passou a ser cada vez mais voltada a eleitores com privilégios, estabilidade e capital cultural.
A direita aproveitou essa oportunidade com notável precisão. Hoje, grupos que tradicionalmente se alinhariam à esquerda têm muito mais probabilidade de votar de forma conservadora. No domingo, Karol Nawrocki obteve a maioria dos votos de agricultores (80,1%), operários (69,3%) e pessoas desempregadas (64,3%).
Essa mudança não se deve apenas ao conservadorismo cultural. Parte dela, claro, está relacionada a valores —a direita dominou a política do medo, especialmente em torno da sexualidade e da imigração. Mas, mais importante do que isso, ela se comunica com esses grupos. Fala diretamente com eles. Oferece programas sociais (ainda que performáticos) que restauram um senso de dignidade —algo que muitos perderam durante a abrupta transição da Polônia para o capitalismo.
Enquanto isso, a esquerda tem se concentrado em mensagens que apelam principalmente às classes médias e altas instruídas, cujo apoio é muitas vezes mais ideológico do que material.
A segunda razão é mais imediata: o governo de Donald Tusk —formado há um ano e meio— simplesmente decepcionou a população. Tusk está agora entre os políticos mais impopulares da Polônia. Segundo as pesquisas mais recentes, apenas 37% dos poloneses estão satisfeitos com ele como primeiro-ministro.
As ações da coalizão têm sido ineficazes, lentas e mal comunicadas. É difícil dizer no que realmente acreditam. Parte disso pode ser atribuída às complexidades da política de coalizão, mas muito mais se deve à incompetência política básica.
Quase nenhuma das principais promessas de campanha foi cumprida —nem aquelas sobre responsabilizar o governo anterior, nem as relacionadas a direitos humanos (direito ao aborto, uniões homoafetivas), nem sequer na área econômica.
A eleição presidencial tornou-se um referendo sobre essa decepção. É um cartão vermelho não apenas para o primeiro-ministro, mas para toda a coalizão que o sustenta. Muitos votos na direita são, na essência, votos contra os demais —especialmente contra o centrismo sem sangue da Plataforma Cívica.
Mas o que a Polônia enfrenta agora também é um problema mais profundo: a divisão profunda da sua sociedade. Mais uma vez, a votação mostrou uma nação dividida quase exatamente ao meio. Um dos memes políticos mais compartilhados na Polônia é uma imagem de uma pesquisa fictícia perguntando: “Você acha que a Polônia está dividida?” 50% dos entrevistados dizem que sim. E 50% dizem que não.