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HomeMundoA roupa nova da (futura) rainha da Espanha - 31/10/2023 - Normalitas

A roupa nova da (futura) rainha da Espanha – 31/10/2023 – Normalitas

Eu sou mesmo uma brazilêra capiau na Espanha.

Por exemplo, quanto a essa coisa de monarquia: eu às vezes esqueço que vivo num país onde não só existe parlamento, eleições e democracia como temos um universo paralelo com rei, rainha e cuentos de hadas.

Mas, hoje (31), nem que eu não queira, tenho que lembrar que a realeza espanhola existe. E que vem adornada com lustres de cristal, tapeçaria de veludo e muito, muito nhe nhe nhé.

Nesta terça-feira gris, a carinha branca-de-neve da princesa Leonor de Borbón y Ortiz estampa todas as tevês de butecos españoles.

Tudo por conta de seus recém-completados 18 anos celebrados em transmissão nacional numa suntuosa sessão de juramento constitucional em Madri.

O grande lance, resumindo, é que essa cerimônia é o primeiro e mais simbólico rito de iniciação indispensável para o passo seguinte: ser rainha.

A partir de hoje, na ausência do pai, Leonor poderá assumir seu lugar de chefe de estado em afazeres múltiplos e missões oficiais.

Leonor será, num futuro não distante, a quarta mulher a ocupar o trono do reino de España, depois de Isabel, La Católica; Juana, La Loca (:(); e sua tatatataktajktajtkatjakaravó, Isabel II, La de Los Tristes Destinos (mel deus) (1830-1904).

E só vai ser rainha porque o rei não teve filhos homens. O artigo 57 da Constituição espanhola de 1978 repisa a tradição que estabelece a dominância macho man no trono.

Leonor tem somente uma irmã mais nova, Sofía, 16 anos, que é tipo a Margaret da realeza espanhola (ou Margarita, como é conhecida por aqui a irmã mais nova da queen Elizabeth).

***

Eu estou em pé num bar pé sujo en las afueras do charmoso bairro de Chamartín, em Madri.

Ao meu lado, a garçonete, colombiana, e um senhor de olhos líquidos azuis detrás do balcão. Observamos, automáticos, a transmissão da cerimônia de juramento constitucional da nova-quase-futura-rainha na tevê. Um casal cicia amenidades, cabeças juntas unidas sobre uma mesa ao canto.

Sucessivas imagens da princesinha, primogênita do rei Felipe VI e da rainha-jornalista-ex-modelo-ex-apresentadora-de-tevê Letizia Ortiz, considerada a primeira rainha “plebeia” da Espanha, agraciam o tédio moscal do nosso princípio de tarde. Outono, dia gélido de fog em Madri (sim, Madri também tem névoa londrina).

“Me comprometo com nossos princípios democráticos e valores constitucionais, que assumo plenamente”, declara Leonor, vestida com um terninho branco confeccionado sob medida pelo costureiro real de seu papá, El Rey, os longos cabelos sobriamente loiros puxados pra trás num rabo de cavalo.

“Peço que confiem em mim, como eu tenho depositada toda a minha confiança em nosso futuro”. Caraca. Que bunito, sô.

A mulher da mesa ao lado fala ao telefone.

Hola, Paco. Sí, así, así vamos. Sí, la princesa… Está Madri toda blindada hoy, verdad?

A princesa e sua imaculada imagem branca adentra os butecos, as conversas, esse artigo de um dia frio e outonal.

Bourbon, a dinastia dos livros de escola. No mise-en-scène du jour, a princesa emerge de um Rolls-Royce, símbolo máximo da realeza. Tudo é controlado, medido, impecável.

Inclusive a modéstia da futura rainha. Respondendo aos jornalistas baba-huevos que elogiam sua segurança, Leonor, A Niña, diz: “tenho que ir melhorando”.

Eu, que não tenho coroa, pago a minha conta e pego minha malinha. Que a vida de nós, súditos, hay que ganarla cada día.

Capiau, penso: de nada, futura rainha. Que quem paga seu terninho branco e seu Rolls-Royce são meus impostos e a história, pródiga em apropriações em nome de reis, rainhas, deuses e contos de fada. Sou uma caipira, mesmo — ainda bem.

Fonte: Folha de São Paulo

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