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Avanços nas relações entre EUA e China não vão durar – 12/10/2023 – Ian Bremmer

Nas últimas semanas, autoridades dos Estados Unidos e da China têm mostrado mais disposição para dialogar. Isso é uma boa notícia para ambos os países e para a economia global. No entanto, o desejo de ambos os lados de evitar disputas custosas no curto prazo não significa que algo tenha realmente mudado no cerne de sua rivalidade cada vez mais contenciosa. O próximo ano trará novos testes, que merecem atenção especial.

Por enquanto, os sinais positivos são concretos. Autoridades dos EUA e da China estão planejando o primeiro encontro presencial entre seus respectivos líderes, Joe Biden e Xi Jinping, em mais de um ano, às margens da cúpula do Fórum de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec) em outubro, em São Francisco.

Também houve um aumento na frequência de reuniões de alto nível entre diplomatas, autoridades financeiras e representantes comerciais dos dois países, em formatos não muito diferentes das reuniões de “diálogo estratégico e econômico” do passado. Nelas, discutiu-se até mesmo assuntos polêmicos como inteligência artificial.

Não há avanços diplomáticos à vista, mas a comunicação regular pode ajudar a aliviar as tensões entre as nações, que aumentaram com o início da pandemia e um subsequente colapso de comunicação.

A relação está melhorando porque ambas as administrações enfrentam desafios domésticos urgentes no momento. Nenhum deles pode arcar com o tipo de confronto de grandes potências que poderia tornar esses desafios mais perigosos e mais caros.

A economia da China tem enfrentado dificuldades desde o fim dos bloqueios da Covid que desaceleraram drasticamente a economia chinesa. O desemprego entre os jovens atingiu níveis tão ruins que autoridades chinesas a pararam de divulgá-los publicamente.

Pequim também pode ver que a política externa mais agressiva que empreendeu nos últimos anos uniu muitos de seus rivais. Japão e Coreia do Sul estão superando diferenças de longa data para cooperar melhor em áreas como segurança e política comercial. A Índia se aproximou dos EUA e se juntou a ele, ao Japão e à Austrália em esforços para conter a expansão da influência do gigante asiático.

Por fim, a Guerra da Ucrânia aproximou muito os EUA e a Europa, pelo menos por enquanto —um obstáculo extra à tentativa chinesa de evitar que potências ocidentais coordenem suas políticas em relação a ela.

Enquanto isso, os EUA entraram em uma temporada eleitoral que pode se mostrar excepcionalmente feia e perigosa, mesmo segundo os padrões americanos. O caos que levou à derrubada do presidente da Câmara dos Deputados, Kevin McCarthy, pela primeira vez na história americana, levantou grandes dúvidas acerca da capacidade da administração Biden de continuar financiando sua agenda cara, incluindo seu apoio à Ucrânia, e os temores de uma desaceleração econômica em 2024 estão crescendo.

Em resumo, Xi e Biden poderiam se beneficiar de um período de calma e previsibilidade em suas relações internacionais mais importantes para que possam se concentrar nos problemas em casa.

No entanto, existem razões estruturais pelas quais não devemos esperar que Washington e Pequim reestruturem suas relações para melhor. Do lado dos EUA, democratas e republicanos não concordam em muitas coisas, mas compartilham a visão de que a China representa uma ameaça aos interesses americanos. Essa convicção é mais óbvia na política tecnológica: os EUA expandiram, por exemplo, os controles de exportação sobre produtos “de uso duplo”, úteis tanto para fins civis quanto militares.

A inclusão de semicondutores avançados na lista de controle é crítica, pois são elementos essenciais no desenvolvimento da inteligência artificial de próxima geração. Os controles de exportação dos EUA impedirão que a China desenvolva produtos de IA suficientemente poderosos para revolucionar a produtividade de quase todos os setores econômicos.

Em resumo, até que a China possa desenvolver seus próprios chips avançados, talvez daqui a uma década ou mais, os EUA tentarão negar à China acesso aos componentes necessários para o poder econômico do século 21. A longo prazo, isso é uma declaração de guerra econômica contra a China, e há pouco incentivo político em Washington para recuar dessa estratégia.

Xi também não mudou suas prioridades de longo prazo, mesmo que, em alguns casos, não falte a ele paciência para persegui-las. Ele continua determinado a resistir ao que percebe como esforços dos EUA e de seus aliados para frear o crescimento natural da China e conter sua ascensão no palco global. A publicação em agosto de um novo mapa chinês do Mar do Sul da China demonstra que o país asiático mantém suas reivindicações territoriais lá, independentemente do que seus vizinhos ou os americanos dizem.

Xi ainda se preocupa com a questão de Taiwan que, ele insiste, não pode continuar a ser passado de uma geração de líderes chineses para a próxima. Em janeiro, a ilha realizará eleições. É provável que seu próximo presidente seja o candidato do Partido Progressista Democrático (e atual vice-presidente) William Lai, um candidato que Pequim tem trabalhado arduamente nos últimos meses para minar.

À medida que o pleito se aproxima, a China tem usado tanto incentivos comerciais quanto demonstrações de força militar para impulsionar o líder da oposição do Kuomintang, Hou Yu-ih. Se, como esperado, Lai vencer, Taiwan pode esperar muito menos ofertas e muitas mais ameaças por parte do continente.

Podemos até ver uma escalada acentuada na pressão do Exército chinês, que inclui provocações navais que testam as regras de engajamento de Taiwan e até inspeções forçadas de navios com destino a Taiwan. O risco de um confronto no mar ou nos céus do estreito de Taiwan que se intensifique além do que Pequim, Taipé ou Washington desejam está aumentando, mesmo que o risco de guerra permaneça baixo por enquanto.

Isso não significa que as relações EUA-China de curto prazo sejam insignificantes. A reunião entre Biden e Xi em São Francisco pode ajudar a abrir novos canais de comunicação que serão muito necessários nos próximos anos. Mas a base da relação bilateral mais importante do mundo continua em terreno instável, e isso não mudará no futuro previsível.


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Fonte: Folha de São Paulo

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