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Imigração italiana no Brasil completa 150 anos – 16/02/2024 – Mundo

Em 3 de janeiro de 1874, um veleiro de três mastros, com o nome de La Sofia, partiu do porto de Gênova com cerca de 400 italianos que moravam no norte do país. Acompanhados por um médico e um padre, o grupo se despediu do inverno rigoroso para chegar, 45 dias depois, ao verão de Vitória, no Espírito Santo.

Há 150 anos, a chegada da embarcação, em 17 de fevereiro, marcaria o início da imigração em massa da Itália para o Brasil. Os meses seguintes se mostraram mais difíceis do que o imaginado, diante do clima tropical e de promessas não cumpridas. Mesmo assim, a maioria permaneceu em território brasileiro.

Antes desse grupo, outros italianos já tinham se instalado no país, mas em menor número e de forma esporádica. A partir do La Sofia, a migração se intensificou e se manteve constante até o início do século 20. Segundo o IBGE, de 1870 a 1920, um fluxo de cerca de 1,4 milhão de italianos entrou no Brasil, 42% do total de estrangeiros que vieram nesse período.

O sesquicentenário da travessia Gênova-Vitória será comemorado neste sábado (17) na capital capixaba, com encenação do desembarque no porto e missa na Catedral Metropolitana, às 10h. Outros eventos estão programados ao longo do ano e em outras cidades do estado.

O La Sofia foi uma tentativa de empreendimento de Pietro Tabacchi, italiano que vivia no Brasil desde os anos 1850. Com a intenção de extrair madeira e de cultivar café, ele obteve autorização de autoridades imperiais para formar uma colônia privada no interior do Espírito Santo, com mão de obra imigrante.

“Antevendo o fim da escravidão e ciente de que o Brasil tinha uma política de incentivo, por meio da distribuição de lotes de terra, Tabacchi montou sua própria estrutura e fez um contrato com famílias na Itália”, conta Cilmar Franceschetto, diretor-geral do Arquivo Público do Estado do Espírito Santo.

Seu público-alvo era os camponeses do Trentino-Alto Adige, região que na época pertencia ao Império Austro-Húngaro. Eram famílias de cultura italiana que viviam em pequenas propriedades rurais e já tinham como costume migrar pela Europa durante o inverno, quando o clima dos Alpes limitava a agricultura de subsistência. Naqueles anos, dificuldades sazonais se somavam a outras crises: a Itália era um país recém-unificado, e a industrialização e as relações capitalistas avançavam em nações do norte europeu.

“O Trentino era uma terra de montanha, pequena e marginal, e estava sentindo essas mudanças. Além disso, houve uma série de pragas que afetaram as vinhas. A população estava muito perto da fome”, afirma Renzo Grosselli, sociólogo especialista em emigração que mora na província de Trento, de onde saiu a grande maioria dos passageiros do La Sofia.

A iniciativa de Tabacchi, no entanto, não deu muito certo. Desembarcados totalmente em 21 de fevereiro –desde 2008, Dia Nacional do Imigrante Italiano–, em seguida eles começaram o deslocamento para as “terras prometidas”. Primeiro, até o porto de Santa Cruz e depois para a colônia Nova Trento, onde hoje fica a cidade de Aracruz.

Logo nos primeiros dias na fazenda, os italianos se deram conta das adversidades. “Eles não encontraram condições de trabalho e de moradia dignas. As famílias ficaram todas num barracão, e os homens levavam horas para chegar até as terras em que deveriam trabalhar”, diz Simone Zamprogno, descendente na sexta geração de italianos que chegaram ao Brasil no La Sofia.

O grupo, então, revoltou-se e, no começo de abril de 1874, há registros de que alguns começam a deixar a colônia de Tabacchi. Cerca de 140 italianos aceitaram uma oferta do governo imperial para ficar no Espírito Santo, na colônia Santa Leopoldina, desde os anos 1850 formada por suíços e alemães. Mais tarde, as famílias se estabeleceriam em lotes públicos do Núcleo do Timbuhy, que se tornaria a cidade de Santa Teresa.

Outras se moveram pelo país e chegaram ao Paraná e ao Rio Grande do Sul, onde estavam instaladas colônias alemãs. Segundo Franceschetto, do Arquivo Público, estima-se que uma dezena teria voltado para a Itália. Meses depois do desembarque do La Sofia, Tabacchi morreu, em junho de 1874.

Apesar das frustrações iniciais, o êxodo de italianos para o Espírito Santo ganhou força nos meses seguintes. Em 1875, chegaram ao menos outras cinco embarcações, com centenas de imigrantes, e até 1877, segundo o Arquivo Público, entraram ao menos 3.400 colonos. Além da busca por melhores condições de vida fora da Itália, as viagens foram impulsionadas pelos navios a vapor ou mistos, que reduziam em até 20 dias o tempo de travessia.

Do lado brasileiro, vigorava também uma política oficial de subvenções para atrair europeus. Havia a necessidade de mão de obra, em substituição aos escravos –a Lei do Ventre Livre é de 1871–, e de ocupação do território, para além dos indígenas. Ao mesmo tempo, as autoridades imperiais pretendiam promover o “embranquecimento” do brasileiro.

“Existiam na época teorias científicas que associavam um conjunto de elementos positivos às populações do norte da Europa, criando a ideia de que eram mais inteligentes, capazes e trabalhadores”, afirma Luis Fernando Beneduzi, nascido no Brasil e hoje professor de história e instituições das Américas na Universidade Ca’ Foscari de Veneza. “Numa sociedade multirracial como a latino-americana, a importação de mão de obra europeia era vista como solução para transformar a população e construir uma nação mais rica.”

Além do legado de mais de 30 milhões de descendentes estimados no Brasil e outros 797 mil com cidadania italiana que vivem hoje no país, o fluxo imigratório influenciou a formação da economia, da sociedade e da cultura brasileira. Para Beneduzi, uma questão fundamental é a diversificação que os italianos incentivaram tanto na produção quanto no consumo de bens.

“Eles trazem outros hábitos alimentares e vão contribuir para o processo de industrialização e um ciclo de crescimento para além da exportação do café”, afirma o professor. “Também teriam participação importante na criação dos primeiros sindicatos, gerando nova movimentação e pressão social.”

Fonte: Folha de São Paulo

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