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Retórica dura de Taiwan aumenta a tensão com China – 03/07/2025 – Ian Bremmer

A China tem pressionado Taiwan há anos. O dirigente Xi Jinping fez da reunificação um pilar fundamental de sua agenda nacionalista e ordenou que o Exército de Libertação Popular esteja pronto para tomar a ilha até 2027. Mas desde que o presidente pró-independência de Taiwan, Lai Ching-te, assumiu o cargo em janeiro de 2024, a pressão aumentou, com incursões aéreas e navais na zona de defesa aérea de Taiwan ocorrendo diariamente.

No início, o presidente Lai respondeu com cautela e evitou irritar Pequim desnecessariamente, não vendo motivo para colocar em risco a forte economia de Taiwan e seus altos índices de aprovação. Mas a retórica de Lai contra a China continental tornou-se cada vez mais uma retórica de confronto nos últimos meses.

Em 13 de março, ele fez um discurso no qual propôs 17 medidas que Taiwan deveria tomar para combater as ameaças impostas pela China e suas tentativas de se imiscuir no governo e na sociedade taiwanesa. E, desde 22 de junho, Lai proferiu três de dez discursos planejados sobre “unidade nacional”, afirmando a independência cultural, política e histórica de Taiwan em relação à China ao longo dos séculos, instando os cidadãos a se unirem contra o comunismo e a lutarem contra a ameaça de anexação chinesa, alertando que Pequim está tentando apagar a identidade nacional taiwanesa.

Por que fazer isso agora? O Partido Democrático Progressista (PDP) de Lai controla a Presidência, mas não o Legislativo, onde o Kuomintang (KMT) e o Partido do Povo de Taiwan conquistaram uma pequena maioria em janeiro. A oposição desde então cortou o orçamento e aprovou projetos de lei para limitar os poderes do Executivo enquanto amplia os poderes do parlamento controlado pelo KMT.

Incapaz de aprovar leis, o PDP está apoiando uma eleição especial em 26 de julho contra dezenas de legisladores do KMT, na esperança de conquistar pelo menos seis cadeiras e recuperar sua maioria legislativa. As declarações de Lai são projetadas para estimular o fervor nacionalista e retratar o KMT, que defende políticas mais conciliatórias em relação a Pequim, como uma quinta coluna trabalhando contra os interesses de Taiwan.

Mas se para Lai isso é política interna, para os líderes da China são palavras de guerra —e elas estão elevando a temperatura no Estreito de Taiwan.

Pequim não deixará as provocações passarem. Autoridades chinesas já criticaram duramente a retórica de Lai como um “manifesto de independência de Taiwan”, e a mídia estatal alertou sobre “autodestruição”. Embora Xi possa esperar até que Lai tenha proferido todos os dez discursos antes de lançar uma resposta, os planejadores militares certamente estão elaborando exercícios em larga escala, inspirados na manobra massiva que se seguiu à visita da ex-presidente da Câmara dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, em 2022.

Podemos esperar testes de mísseis sobre a ilha, flotilhas cercando-a e inspeções da guarda costeira em embarcações civis taiwanesas que poderiam interromper o transporte comercial se Pequim decidir prolongar o exercício militar.

Pequim poderia ser ainda mais ousada, mas será dissuadida pelo fator imprevisível que é a função de resposta do presidente Donald Trump. Embora o Congresso dos EUA, o Pentágono e grande parte do gabinete de Trump sejam linha-dura em relação à China, os líderes chineses veem as tendências isolacionistas do presidente e seu desinteresse pessoal por Taiwan como um sinal de que a reação dos EUA a movimentos ambíguos pode ser menor.

Mas Trump é, acima de tudo, imprevisível (veja o caso do Irã), e Pequim deve ponderar se punir Lai com muita severidade poderia provocar uma forte ação dos EUA.

Essa é uma das razões pelas quais uma invasão em grande escala da ilha autônoma não acontecerá no curto prazo. Xi Jinping ainda acredita que o tempo está a seu favor. Por que arriscar tudo agora quando o equilíbrio militar continua pendendo para o lado da China e a própria política de Taiwan pode eventualmente entregar uma liderança mais favorável à unificação?

No que seria possivelmente a operação militar mais complexa da história, um ataque anfíbio a Taiwan arriscaria baixas catastróficas e sanções globais em meio a uma desaceleração econômica contínua. A pressão coercitiva já em andamento –uma combinação de pressão econômica, diplomática e militar– é uma aposta muito mais segura, oferecendo ainda muitos pontos de ajuste incremental.

Para Lai, o benefício político de adotar um discurso duro atualmente supera as desvantagens. A retórica belicosa da China corrói a soberania de Taiwan, mas também mobiliza os eleitores taiwaneses e os aliados ocidentais em apoio ao PDP e à defesa da ilha.

O que observar no próximo mês? Primeiro, os discursos restantes de Lai, especialmente o sexto, que deve abordar diretamente as relações entre os dois lados do estreito. Cada nova provocação dará a Pequim mais um pretexto para mostrar força.

Segundo, a escala e o escopo da resposta militar de Pequim –mísseis, zonas de exclusão, operações da guarda costeira.

Terceiro, quaisquer sinais de Washington –declarações, presença naval no Mar do Sul da China, delegações a Taipei, novas vendas de armas, acordos comerciais com qualquer um dos lados– que possam endurecer ou suavizar a postura de Xi.

Finalmente, a eleição especial de Taiwan em 26 de julho. Se o PDP conquistar seis cadeiras e recuperar o Legislativo, Lai terá menos incentivos para recorrer ao megafone nacionalista; caso contrário, podemos esperar que os riscos continuem altos.

A conclusão é um equilíbrio volátil e instável. Nenhum dos lados quer guerra; ambos encontram utilidade na provocação controlada. O perigo é que o controlado pode rapidamente se transformar em descontrolado em uma névoa de desconfiança, erro de cálculo ou simplesmente má sorte. Até que Pequim e Taipei encontrem um caminho de volta para uma política mais silenciosa, as 110 milhas náuticas do estreito entre eles permanecerão um barril de pólvora.


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Fonte: Folha de São Paulo

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