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Há 50 anos independente, Moçambique busca projeto de país – 24/06/2025 – Mundo

Apenas 50 anos separam a história de Moçambique antes e depois da independência, um momento que resultou de anos de luta armada contra Portugal e consolidou um projeto de base socialista no país em plena Guerra Fria.

As celebrações da data, comemorada nesta quarta-feira (25), acontecem ao largo de um cenário de instabilidade política e crise de representação em que os moçambicanos refletem sobre qual nação foi construída nesse meio século de soberania —e qual é a possível para o futuro.

Após uma eleição disputada em outubro passado e amplamente denunciada como fraudulenta pela oposição à Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), que governa o país desde a primeira gestão independente, protestos violentos irromperam pelo país, em particular na capital, Maputo, e no norte, com mais de 300 mortos e milhares de feridos e detidos até a posse de Daniel Chapo, no dia 15 de janeiro, de acordo com grupos da sociedade civil.

Há um movimento de diálogo interpartidário que, embora tenha reduzido substancialmente os protestos, recebe críticas por ser pouco representativo dos desejos de parte considerável da população, em particular de camadas mais jovens descontentes que compuseram as manifestações —também reflexo global de desconfiança generalizada em eleições e instituições democráticas.

“A crise do sistema político é uma crise de representação política, que se manifesta de uma maneira talvez muito particular para Moçambique, mas a gente vê isso em outros países: a incapacidade dos partidos políticos de produzir projetos políticos”, afirma Elisio Macamo, professor de sociologia e estudos africanos, da Universidade de Basileia, na Suíça.

A chamada comissão técnica, que dará as diretrizes para reformas constitucionais aprovadas pela Assembleia da República, o Parlamento local, é composta por membros dos partidos com assento no Legislativo. Não está nela, no entanto, o principal nome atual da oposição à Frelimo.

Segundo mais votado no pleito, com cerca de 24% dos votos, Venâncio Mondlane tornou-se o mais vocal nome de oposição. Figura que desafia os partidos tradicionais da política moçambicana, embora tenha feito parte de alguns deles, ele não reconhece o resultado e ainda afirma ser o presidente eleito.

Mondlane rompeu em fevereiro com o Podemos (Partido Otimista para o Desenvolvimento de Moçambique), uma dissidência da Frelimo que o apoiou no pleito, e foi convidado para fazer parte do Conselho de Estado, órgão em geral consultivo que reúne o presidente e outras altas autoridades, além de ex-presidentes e convidados. A primeira reunião do grupo após a eleição de Chapo, prevista para esta semana, foi cancelada dois dias após ser convocada.

Nesta terça-feira (24), Mondlane publicou em sua página no Facebook uma suposta convocatória de comparecimento à Procuradoria-Geral, sob pena de detenção —uma amostra de que a tensão pós-eleitoral, se contida após a iniciativa interpartidária de diálogo, ainda está em alta.

Moçambique está hoje na 182ª posição do ranking de 194 países do Índice de Desenvolvimento Humano desenvolvido pelas Nações Unidas e possui um PIB per capita de US$ 1.677, considerada a paridade do poder de compra, de acordo com o Banco Mundial —o do Brasil, nessa métrica, é de US$ 21.107. A dívida pública está hoje em 78,9% do PIB.

As dificuldades de desenvolvimento do país se entrelaçam com a história política do país desde os tempos coloniais. “Aquilo que chamamos de neocolonialismo são essas formas de dependência econômica que persistem mesmo depois da independência, que têm a ver com atividades e investimentos do período colonial que privilegiaram uma economia de exportação”, diz Alexandre Marcussi, professor de história da África da Universidade de São Paulo (USP).

Os episódios ocorridos desde outubro passado evocam também outros momentos de violência pós-eleitoral, não rara no país, que ocorre em maior ou menor grau desde o primeiro pleito, em 1994, após o fim da guerra civil (1977-1992).

A conflagração opôs a Frelimo à Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), contrária ao projeto socialista da Frente, apenas dois anos depois da independência, e terminou com a instituição de uma democracia multipartidária que, no entanto, herdou uma institucionalidade marcada por anos de regime de partido único e captura de um Estado já fragilizado.

“Acho que a Frelimo perdeu o fio condutor”, afirma Macamo, da Universidade de Basileia. “Eles meteram na cabeça que são o guia da nação, que Moçambique só faz sentido se entendida como Frelimo, e isso criou uma mentalidade política muito nociva para qualquer mudança.”

Fonte: Folha de São Paulo

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