Dois touros, cada um com quae 600 quilos, colidem com força, chifres contra chifres, enquanto seus músculos se contraem sob pelagens aveludadas.
Eles lutam em um cercado de areia no centro de um estádio, incentivados por uma plateia animada. “Empurra ele, seu danado!”, grita um espectador.
Essa disputa entre touros, típica da zona rural da Coreia do Sul, não termina em morte: o combate acaba quando um dos animais foge. Competições assim ocorrem no país há centenas de anos.
Nas colinas do sul coreano, as touradas são motivo de orgulho para vilarejos. Pecuaristas escolhem jovens touros grandes e com chifres proeminentes. Para aumentar força e resistência, os treinadores os fazem puxar pedras pesadas e subir montanhas.
As lutas ocorrem quase todos os fins de semana no Estádio de Touradas de Cheongdo, próximo à cidade de Daegu. Os animais são pesados um dia antes da competição e borrifados com desinfetante para evitar infecções.
Nos estábulos ao redor do estádio, os treinadores cuidam dos animais e protegem os chifres com moldes de gesso para preservar a afiação. Os touros começam a carreira por volta dos 2 ou 3 anos e atingem o auge aos 6. Apesar da ferocidade no ringue, são dóceis com seus cuidadores.
O estádio foi inaugurado em 2011 e tem capacidade para cerca de 12 mil pessoas. Em um domingo recente, as arquibancadas estavam esparsas no início da tarde, mas foram enchendo ao longo do dia.
Os duelos podem durar de alguns segundos a até meia hora. Parte da popularidade se deve ao fato de que a tourada é uma das poucas atividades em que é permitido apostar na Coreia do Sul.
Para alguns fãs, as disputas em Cheongdo são um ritual semanal. “Aqui posso gritar, torcer, aplaudir e liberar todo meu estresse”, diz Park Kyung-won, 56, que frequenta o estádio com o marido todos os fins de semana há dois anos. Em dias de sorte, já ganharam até 2,5 milhões de won (cerca de R$ 10 mil).
Ativistas de direitos dos animais denunciam que as touradas causam dor, sangramentos e ferimentos desnecessários. “Forçar touros a lutar e sangrar contra a vontade não traz nenhum valor educativo para famílias com crianças e promove uma cultura de desrespeito à vida”, afirma Cho Hyun-jeong, ativista em Seul.
A Lei de Proteção Animal de 1991 proíbe ferir animais com fins de jogo ou entretenimento, mas abre exceção para práticas tradicionais conhecidas como jogos folclóricos, categoria em que se enquadra a tourada.
A tradição tem raízes profundas na história coreana. Há registros em contos populares desde os anos 1500. Até hoje, ter um touro vencedor é motivo de prestígio para sua cidade natal.
“Alguns não conseguem entender o orgulho imenso que sentimos quando nosso touro vence”, diz Kim Chang-sub, cuja família treina touros há gerações.
Esse orgulho ajuda a explicar a dieta dos animais, que inclui feijão, ginseng e enguia.
Dono e treinador, Park Jae Sung, diretor da tourada de Cheongdo e representante da terceira geração de sua família na prática, afirma que os animais recebem cuidados antes e depois das lutas. Cremes anestésicos são aplicados nos chifres e ferimentos são desinfetados. “Touros são como garotos”, diz Park. “É do instinto deles lutar e provar quem manda.”