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Libertação de reféns de Gaza reabre feridas em Israel – 25/01/2025 – Mundo

Entre esperança e desalento, as imagens das três primeiras reféns do Hamas deixando o cativeiro na Faixa de Gaza após 471 dias também reabriram feridas que exemplificam o trauma nacional do 7 de Outubro em Israel.

Para Sigal Halifa, 54, “a felicidade veio com um sentimento de tristeza”. Seu caso é emblemático da complexa rede de emoções que o ataque do grupo terrorista ainda provoca no país.

Ela é mãe de Gaya, 24, que morreu ao fugir do cerco do Hamas ao festival de música eletrônica Nova, no deserto perto de Gaza, onde tombaram 383 pessoas. A seu lado estava sua melhor amiga, Romi Gonen, então com 23 anos, uma das três reféns que o grupo terrorista palestino libertou na primeira leva do acordo com Israel no último domingo (19).

Sigal encontrou-se com Romi nesta semana. “Eu a abracei e senti que estava abraçando a Gaya. Choramos muito, e ela lembrou de cada momento daquele dia. Ela sente muito, sabe que perdeu sua melhor amiga”, contou a mãe à Folha por vídeo nesta sexta-feira (24).

“Ela me contou que Gaya agiu como uma comandante naquela manhã, desde o início do ataque, às 6h30. Mas por volta das 10h, ela começou a ficar preocupada e com medo”, disse Sigal, cuja família tem um dos registros mais arrepiantes do 7 de Outubro.

Gaya passou a manhã em contato com o pai, Avi, por WhatsApp. Ele mostrou, em 2023, a troca de mensagens à Kan TV israelense. Gaya parece centrada, tentando acalmar a todos. A família credita isso ao fato de que ela havia sido médica de combate quando serviu no Exército de Israel —mulheres passam dois anos no serviço militar, oito meses a menos do que homens.

Isso até cerca de 10h, quando ela fugia à cidade de Ashod no carro de Ben Shimoni, um dos heróis desconhecidos daquela manhã, que fez várias viagens para resgatar jovens que estavam no Nova como ele. No veículo também estavam Romi e Ofir Tzarfati, cujo corpo viria a ser recuperado por soldados operando em Gaza um mês depois.

Gaya ligou para o pai aos gritos, dizendo estar sob fogo. “Depois dos tiros, ele só ouviu duas respirações finais da nossa filha”, conta Sigal, que trabalha em uma escola de Kiryat Ono, nos arredores de Tel Aviv. Ela diz que Avi, 57, chefe financeiro de uma empresa local, “nunca mais vai esquecer aquele momento”.

Ao se reunir com Romi, Sigal reviveu a tragédia, mas também mirou um fecho simbólico, com a confirmação do papel da filha naquele recorte do drama. E ainda celebra a coragem de Shimoni, cujo corpo foi encontrado alguns dias depois.

O carro que ele usou nos resgates, cravejado de balas, está no memorial com veículos destruídos naquele dia instalado a sete quilômetros do local do Nova, também transformado em ponto de peregrinação.

Neste sábado (25), o Hamas diz que irá soltar mais quatro reféns, todas mulheres soldados, em troca de um número incerto de prisioneiros palestinos. No domingo passado, foi a vez de Romi, e outras Romis poderão disparar gatilhos em famílias como a de Sigal.

A mãe de Gaya é bastante discreta acerca de seu encontro com a amiga da filha, mas diz que “daqui a um mês a adrenalina dela vai baixar” e os impactos da realidade suplantarão a euforia da libertação. Sigal envia uma série de fotos das duas, invariavelmente em baladas ou viagens.

O Brasil ocupa um lugar especial nessa história. O país foi um dos destinos da viagem à América do Sul que as duas fizeram no tradicional mochilão de seis meses que todos os jovens israelenses fazem após a dureza do serviço militar —recentemente, um desses teve de deixar o país antes que um juiz o ameaçasse sob a acusação de crimes de guerra.

Há fotos das duas em praias, como Jericoacoara (CE), e fazendo pose na frente do Cristo Redentor, no Rio. Gaya teve até uma experiência inusitada, tendo de remover dois dentes do siso que encrencaram durante a viagem. Antes de morrer, a jovem se preparava para cursar economia.

Como outras famílias que antes tinham uma visão em favor da paz na região, os Halifa agora são céticos e críticos do governo Binyamin Netanyahu. “Agora é muito tarde. Deveríamos ter dado um ultimato de um dia para o Hamas e, se não desse certo, deveríamos deletar Gaza”, disse —a segunda parte da avaliação se concretizou, com 92% dos edifícios da faixa destruídos ou atingidos pela guerra, segundo a ONU.

Sigal diz que Israel “perdeu a guerra”. Em casa, as reações variavam: Avi segue obcecado pelo telefonema final, enquanto o primogênito Ido, 29, trocou o psicólogo por treinos de triatlo. Já a caçula Nogan, 18, entrou no Exército e quer ser médica de combate como a irmã.

Em comum, todos fizeram a mesma tatuagem que Gaya carregava, um gramofone com um coração, símbolo do amor dela pela música. “Precisamos contar a história para que não se repita. É o como no Holocausto“, diz a mãe.

Fonte: Folha de São Paulo

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